domingo, 3 de maio de 2015

Uma Seara de Luz!

Homenagem a Dr. Harry Quadros de Oliveira


A presente publicação, faço, por merecida homenagem à pessoa, Harry, pelo que searaenses pensam no íntimo de suas almas, do bem com que ele agraciou a todos nós. Temos orgulho desta convivência exemplar e do bem que nos legou. Semeador de ideais, plantaste na tua Seara, as melhores sementes de primorosos sonhos.
Que a Praça principal de nossa pequena Seara possa ter sempre singelas flores cultivadas para perfumar viva lembrança deste exemplo de vida que é. Então! Força Inês!, ainda podes plantar muitas flores.
 E, sabes, Dr. Harry, aquela outra praça do Bairro do frigorífico tem o nome da tua amiga, primeira enfermeira improvisada, Henriqueta, do teu “hospitalzinho” como chamavam. Coincidências, não?. Deus os abençoe!
Segue, como penso ser, as assinaturas da presente publicação.




Dr. Harry Quadros de Oliveira –

Texto de Euro Zanuzzo, com informações de Inês Grando Detoni, produzido para ser lido em sessão solene de outorga do Título de Cidadão Honorário de Seara pelo Presidente da Câmara Municipal, então, Alcir Bonissoni, em 1998).

‘Harry nasceu no dia 15 de agosto de 1917, natural de Dom Pedrito, Rio Grande do Sul, filho de Fortunato e Edelmira Quadros de Oliveira. Em sua ascendência, avós maternos de origem portuguesa e paternos descendentes de espanhol e índio. Proveniente de família numerosa e de poucos recursos financeiros, seu Pai Fortunato, era farmacêutico e o estimulou ao estudo.
De formação religiosa católica, foi estudar no Colégio Marista de Rosário do Sul, RS, ainda com 12-doze-, anos de idade. Além de estudar, para manter-se, trabalhava no Frigorífico Swift, como salgador de carnes.
Continuou os seus estudos de Ginásio em Santa Maria, RS, mantido pelos Irmãos Salesianos e residindo na casa de sua irmã que o ajudava financeiramente.  De uma família de músicos, tal seu Avô e Pai, é nesta época que sentiu o gosto musical e aprendeu a tocar Violino. A casa de seu Pai era como um centro de cultura musical, onde outro irmãos tocavam acordeão e demais instrumentos musicais.
Após conclusão do curso intermediário, veio a cursar Medicina na Faculdade de Porto Alegre, RS, sempre necessitando trabalhar para manter-se, pois era de família pobre.
Veio a formar-se em 1942, com enorme vontade de exercer a Medicina e em conversa com colegas seus, restou sabendo que em Nova Milano, vila do Município de Concórdia em Santa Catarina, necessitavam do trabalho de um médico e que tratava-se uma colônia de economia forte e progressista, decidindo então tentar esta oportunidade.
Chegou em Seara com o caminhão do Sr. João Farina, que foi a primeira pessoa da comunidade a conhecer. Era o final do ano de 1943.

Dr. Harry e seu Jeep, cercado de amigos, Teodoro Barbieri, Euclides Casagrande, Herculano Zanuzzo, João Farina, Honorato Zonta, Etelvino Tumelero, entre outros.

Aqui veio a conhecer Fioravante Massolini, líder político regional e responsável pela colonização da Vila Nova Milano e vilas vizinhas de Anita Garibaldi e Sede Arvoredo. Conheceu também outros lideres importantes como Theodoro Barbieri, comerciante; Valentim Petry e a Viúva Henriqueta Zanuzzo, passando a residir na sua casa como pensionista.
Com a ajuda financeira destas pessoas citadas e outras da localidade, veio a adquirir equipamentos básicos para a prática da medicina e procedimentos cirúrgicos, instalando um pequeno Hospital na casa de Henriqueta Nardi Zanuzzo. Este pequeno hospital funcionou por pouco mais de (3) três anos. Também instalou-se uma  pequena Farmácia pertencente ao farmacêutico Napoeão Dekeche, de Concórdia, administrada pelo Sr, Valentim Petry. Este, junto a Dna. Henriqueta, ajudavam o Dr. Harry como enfermeiros nas práticas cirúrgicas e no atendimento aos pacientes.
Herculano Zanuzzo, Celino Rocha de Araújo, Dr. Harry e Aurélio Paludo.

Dr. Harry dedicou-se de corpo e alma a sua profissão. Foi á luta como um jovem forte e destemido. Sua primeira cirurgia, apendicite, em um filho do Sr. Artifon, preocupou os familiares que receavam que o novo médico, de aspecto franzino, magrinho e moreno, em meio a um povoado de origem italiana, as pessoas custavam a adquirir confiança. Ms Dr. Harry era muito cauteloso e paciente, salvando o moço. O fato repercutiu e com o seu trabalho e dedicação adquiriu plena confiança da comunidade.
Passaram-se 3-três-anos, Nova Milano já adquirira a condição de Distrito do Município de Concórdia, com a denominação de Distrito de Seara, e a comunidade sentindo a necessidade de ampliação do espaço hospitalar que tomara conta de todo espaço da casa de Dna. Henriqueta, inclusive porões, reuniram-se e com a participação de todos, construíram o 1º. Hospital de Seara, a Casa de Saúde São Roque, decidindo que ficaria á cargo da recém criada (1944) Paróquia de Seara, então com o Padre Simão Moser. Este, trouxe para Seara algumas irmãs da Congregação São José para auxiliar no Hospital, entre elas, Madre Ludovida e Irmã Terezinha, entre outras, que muito colaboraram na manutenção e cuidados com a saúde.
Henriqueta Nardi Zanuzzo.

Dr. Harry deixou a casa de Dona Henriqueta e passou a morar no Hospital para melhor atendimento, levantando muitas vezes na noite, sendo Médico, enfermeiro e atendendo aos pacientes internados.
Muito ajudou às pessoas pobres e o fazia de coração, mesmo. Os melhores anos de sua vida, palavras do próprio Dr. Harry foram os passados em Seara. As dificuldades eram muitas. Não havia energia elétrica e fazia as operações tendo como iluminação as lanternas, lamparinas e velas. Valia-se de instrumentos rudimentares, autoclave e outros equipamentos, alguns ganhos de seu Pai que era farmacêutico.
7 de setembro, na futura praça Dr. Harry Q. Oliveira, tendo ao fundo, segunda casa, onde funcionou o 1º hospitalzinho na residência de Henriqueta Zanuzzo.

Nas emergências à noite, também atendia no interior, partos realizados em casa de pacientes, com lanternas, etc. Seu meio de transporte era um cavalo preto de propriedade do Sr. Theodoro Barbieri. Também, utilizava uma mula, do Sr. Pedro Benetti, atendendo um interior de 20 a 30 Km como único médico. Como resultado das cavalgadas, no dia seguinte ficava com muitas dores lombares, “descadeirado”, como diziam. Mas nada o impedia do atendimento, a chuva, o frio, as dificuldades todas, tendo orgulho em dizer que nunca recusou atender pobres e necessitados. Em razão disto, a população de Seara e região o chamavam de “Pai dos Pobres”. Após ganhar algum dinheiro, adquiriu um Forzinho e uma vez rolou ribanceira abaixo, visto que as estradas, ou melhor, os caminhos eram péssimos naquela época. Comenta o Dr. Harry, hoje com 81 anos-, (1997 -ano em que recebeu o título de cidadão honorário), ainda trabalha aos sábados no Hospital de Caridade de Cachoerinha, RS, na grande Porto Alegre, pois continua a praticar a medicina, atendendo necessitados gratuitamente.
No lado político, como cidadão, na Vila Nova Milano, e na formação de Seara Distrito de Concórdia e após Município, sempre trabalhou, colaborou e estimulou o progresso como um líder comunitário. Presidiu a comissão de emancipação do Município de Seara, um idealista político, indo várias vezes a Florianópolis pela Comissão Emancipacionista de Seara, com seus companheiros Aurélio Paludo, Theodoro Barbieri, Herculano Zanuzzo, Celino Rocha de Araujo, Clayton Wosgrau e outros. Nunca deixou de participar, colaborar e apoiar melhorias comunitárias, jamais perdeu um amigo, sempre pensando pelo bem e progresso do Município.
Lutou com imensas dificuldades da época, pois as doenças que afetavam o nosso colono, trabalhador da terra, onde machucados eram comuns de acontecer e provocavam a incidência de infecção e a ocorrência do perigo do tétano. Quando chamavam o médico, o doente já estava bem mal. Mas atendia em qualquer horário e condição. Doenças graves como meningite, tifo, tétano. Operou verdadeiros milagres com suas mãos pela benção de Deus. Preocupava-se em manter-se atualizado na Medicina, estudando doenças e fazendo cursos no exterior.
Foi em Nova York que conheceu aquela que seria sua esposa, Lidia, norte-americana, com quem se casou vindo a fixar domicílio em Seara e tendo o casal 6 -seis- filhos, dos quais 3 são searaenses. Dois deles são médicos, uma filha enfermeira nos Estados Unidos, onde tem um filho também que é aviador.
Além de médico, Dr Harry tinha alma e sensibilidade de artista e em Seara colaborou com todos setores, educação e cultura, Igreja onde tocava Violino e acompanhava o Coral São Daniel e as apresentações do mesmo. Pode-se dizer que Dr. Harry representava uma liderança única e singular para Seara, personalizava a cultura universal, liderando e dirigindo inúmeros setores sociais. Preocupou-se muito com a agricultura que era o esteio de nosso progresso, na implantação do Moinho Seara. Incentivou novas culturas, qualidade de sementes e técnicas de plantio. Adquiriu áreas agrícolas, trouxe maquinários novos, procurou incentivar e divulgar aprimoramentos das atividades de nossos colonos.
Partiu de Seara com sua família em Março de 1966, deixando imensa saudade. Saiu tranquilo e com a certeza do dever cumprido em Seara, terra que ama de todo coração. Comenta que saiu em tempo certo e necessário para atender condições e interesses de família, esposa e seis filhos, mas que parte de seu coração permanece em Seara. Pretende-se hoje com esta homenagem de titulação como Cidadão Searaense, devolver ao Dr. Harry um pouco do muito do que Seara e todos nos lhe devemos. (1998)”


Dr. Harry Quadros de Oliveira- Comemoração de seus 80 anos de idade, em Porto Alegre, RS.

Por ocasião do aniversário de 80-oitenta-anos do Dr. Harry, o Município de Seara por suas lideranças, houveram por bem homenageá-lo. Era o ano de 1997 e o mesmo residia em Porto Alegre, RS.
A comunidade se mobilizou e junto à Empresa Seara conseguiu-se para ser presenteado ao aniversariante uma Cesta dos melhores produtos da Marca Seara, ficando a encargo da Casa da Cultura representar Seara nas festividades do evento em Porto Alegre.
Ines Grando Detoni, Levino Detoni e Euro Zanuzzo estiveram presentes nas festas de aniversário que se iniciaram com uma Missa especial ao aniversariante, programada pela Família. Por ocasião desta Missa, no Ofertório, foi-lhe presenteada a cesta de produtos Seara, junto a outras lembranças símbolos da terra searaense, ocasião em que também foi lido por Dona Inês Grando Detoni, texto próprio que produzimos para a ocasião, cujo teor copiado e digitalizado é exposto na forma original adiante.

Ofertório da Missa de agradecimento pelos 80 anos de Vida do Dr. Harry Quadros de Oliveira (1997).




Observação: O doc, supra traz equivocada a data de instalação do Município, que é 03 de abril de 1954. 15 de abril, como consta, mas de 1944, foi a instalação do Distrito.


80 anos Dr. Harry, Porto Alegre, casal Levino e Ines Detoni, casal Dr. Genaro e Eni Zanuzzo Laitano, Dr. Harry, dona Lydia e familiares, Maurí Barbieri e Euro Zanuzzo.


Construção da Casa de Saúde São Roque de Seara,
Tendo como referência base o Livro Tombo da Paróquia São Daniel de Seara, registros do Pe. Simão Moser, específico em notícias sobre este assunto, pesquisa elaborada por Inês Grando Detoni, constante de escritos sobre a História de Seara.
 Antigo Hospital São Roque à esquerda, com a sala de operação e construção do novo hospital.


Fatos e notícias relativas à construção do 1º. Hospital de Seara

“No dia 22 de abril de 1945, houve uma reunião dos Fabriqueiros da Paróquia, tendo por finalidade tratar da construção de um hospital, de vez que o hospitalzinho de Dna. Henriqueta Zanuzzo, se mostrava insuficiente para o atendimento da crescente demanda de leitos, e o Dr. Harry Quadros de Oliveira que chegara no ano de 1943 em Seara, o médico, necessitava de uma casa e de melhores condições para o desempenho de seus serviços.
A Fábrica da Paróquia resolve então formar uma Comissão encarregada da construção do hospital, sendo composta pelo Pe. Simão Moser, o Sr. Luiz Benetti, o Sr. Martino Nava e o Sr. Santo Paludo..,
Foi recomendada se fizesse uma planta de construção encomendada ao Sr. Leonidas Fávero, em Concórdia, dimensionando-se a construção de 22,50m por 9,00 m, com um adendo de 4,00 por 6,00m em uma extremidade pra conter a sala de operações e cirurgias e mais outro adendo de 5,00 por 7,00m, possuindo 7,00m de altura e um porão depósito.
A planta foi apresentada em 21 de julho de 1945, durante a Festa de São Luiz, para conhecimento público e houve o lançamento da Pedra Fundamental da Construção da Casa de Saúde São Roque, para a qual se adquirira os lotes n. 53, 54 e 55, pelo preço de Cr$ 3.000,00.,
Observa-se que neste mesmo ano de 1945, a comunidade searaense já contribuíra para a construção do Seminário Diocesano de Lages, com a quantia de Cr$ 13.002,80.,,
Os fabriqueiros tentaram conseguir uma máquina a vapor para o moinho e instalação de uma serraria para atender o madeirame necessário para o Hospital, mas a máquina acabou indo para Vidal Ramos (São Roque), no Engenho dos Casarotto, onde a madeira quadrada do hospital foi serrada e as tabuas serradas no Engenho do Sr. Rafael Bernardi.,.
Em fins de novembro de 1945, iniciaram-se os trabalhos da construção, sendo contratados os Srs. Ivo Gehlen & Magnani, por Cr$ 18.500,00..,.
Enquanto corria o ano de 1946, prosseguia a construção, contratando-se os carpinteiros, José Bassani e Lorenzetti, de Concórdia.,.
A inauguração da Casa de Saúde era para ser dia 08 de dezembro de 1946, mas não restando conclusa até então, transferiu-se para o dia 09 de fevereiro de 1947, quando foi inaugurada, encontrando-se presentes o Pe. Achilles Klockner de Concórdia, representando o Bispo Dom Daniel Hostin de Lages; o médico Dr. Harry Quadros de Oliveira; o Gerente da Colonizadora Rio Branco, Sr,. Fioravante Massolini, o Dr. Carlos Buchelle e demais autoridades do Distrito..,.
Em 02 de abril de 1948, foi eleito presidente da Fábrica, o Sr. João Nardi, Vice- Aurelio Paludo, 1º. Tesoureiro Theodoro Barbieri, 2º. Tesoureiro Amelio Tumelero, 1º.Secretário Luiz Sfredo, 2º. Secretário Deolindo Zilio e Conselheiros, Luiz Cerutti, João Garghetti, Rafael Bernardi, David Tochetto e Sétimo Octavio Casarotto.,.
A administração da Casa foi confiada para Irmãs de São José, Madre Maria da Apresentação, Irmãs Aneli e Amábile e em 12 de abril de 1949, um ano depois, Irmã Cipriana.,.
Em 10 de maio de 1948 chegou como Delegado Especial da Diocese de Lages, o Pe. Henrique Barison.,. Entre atividades de escrituração, administrativas e religiosas na Paróquia, iniciou uma coleta de fundos junto à comunidade, vindo a arrecadar o correspondente a dois terços da dívida total da Casa de Saúde São Roque, em um total de Cr$ 205.000,00.,.
Em 29 de maio de 1948, Pe. Henrique Barison, despede-se de Seara, sem saber que haveria de retornar em 1949 para ser o 2º. Pároco de Seara, assumindo em 13 de fevereiro de 1949.,.”
(O presente relato sintetizado em breves notícias extraídas do Livro Tombo da Paróquia São Daniel de Seara, pesquisa realizada por Inês Grando Detoni, parceira de trabalhos constantes do escrito História de Seara.) Euro Zanuzzo.


DO PEQUENO HOSPITAL DE DONA HENRIQUETA NARDI ZANUZZO E Dr. HARRY QUADROS DE OLIVEIRA (SEGUNDO RELATO DE DONA ELIBRETINA M. ZANUZZO TUMELERO).

Elibretina Maria Zanuzzo Tumelero, autora deste relato.

Primina Verônica Zanuzzo Dal Maz.


            Ao chegar a Seara (Nova Milano), Dr. Harry, após várias palestras e contatos com o pessoal da Vila e região, estes resolveram financiar a aquisição dos equipamentos essenciais para um atendimento médico hospitalar.
Como na Vila não houvesse construção outra mais adequada para instalação de uma Casa de Saúde, optou-se pela maior e melhor casa que era a residência de Dona Henriqueta Nardi Zanuzzo, viúva do colonizador e pioneiro Antonio Zanuzzo, que fora assassinado em 05 de maio de 1935.
Esta casa se situava onde hoje se ergue o Edifício Milano e a residência da Família Zanuzzo, em frente à Igreja Matriz. A casa era de madeira, assentada sobre muros de pedra, com um pavimento intermediário em nível da rua principal, hoje Avenida Anita Garibaldi, um porão inferior e um andar superior (sobrado).
De início, o hospital utilizou o andar superior (sobrado), distribuído em cinco quartos, enquanto em nível da rua, havia uma farmácia instalada e dependências ocupadas pelo então farmacêutico, Valentim Petry e os familiares Herculano e Mansueto Zanuzzo.

Valentim Petry, farmacêutico e enfermeiro no hospitalzinho.
Foto com seu filho Nelson.

A primeira ocupação foi adequar a construção ao uso hospitalar, efetuando-se forrações, reformas e pinturas, bem como a aquisição dos equipamentos necessários para consultório, clínica e cirurgia.
Após algum tempo de funcionamento no andar superior e dado ao movimento cada vez mais crescente e falta de espaço, a farmácia do Sr. Valentim Petry transferiu-se para outro local e o hospital passou a usar o andar em nível da rua principal, com consultório, sala de esterilização, autoclave (aparelho de esterilização a vapor que alcança temperatura à 100º e destrói germes, micróbios e bactérias de instrumentos cirúrgicos), e outros equipamentos.
Assim nos relata a Sra. Elibretina Maria Zanuzzo Tumelero. “O Dr. Harry se instalou na Casa da Mamãe. Ele quando chegou, não tinha uma tesourinha, não tinha nada. Nem foi pro Hotel. Ele fez reuniões com o pessoal. Acertou como trabalhar. Iniciou a reforma da casa, arranjou o dinheiro e foi comprando o equipamento. Depois começou a trabalhar devagarzinho, foi reformando, se instalando, até que montou a sala de cirurgia e passou então a operar e fazer tudo que um clínico geral e cirurgião fazia. Mamãe e nós todos trabalhávamos para manter o hospital em funcionamento. A mãe era enfermeira, ajudante, costureira, lavadeira, tudo. Nós também fazíamos tudo. Nossa!... Era tanto trabalho... Eu, a Primina... Limpeza, comida, enfermaria, esterilizar instrumentos, lavar, passar, cuidar doentes, enfim tudo que um hospital precisa, na proporção daquilo que era”.
E continua...
“Mamãe queria tudo limpinho, como devia ser um hospital, lógico. Era uma exigência. Nós tínhamos muito trabalho, e trabalho para se fazer entender com toda aquela” “gente humilde” e muitas vezes ensinar higiene pessoal e íntima, cuidando de não ofender as pessoas na sua simplicidade. Era uma coisa difícil e melindrosa”.
Com o tempo, o movimento do hospital foi crescendo e acabou por se expandir pela casa toda, ocupando todas suas dependências. Instalaram-se mais quartos, estes isolados, para tratar das doenças infecto-contagiosas, perigosas de transmissão, como o caso do tifo.
Perguntada sobre a compensação financeira da atividade do Hospital de Dona Henriqueta, sua filha Elibretina, respondeu: “A mãe, pobrezinha, recebia era trabalho, só trabalho. Sim, que pagavam uma diária, mas mal... e mal. Muitos mesmo, não tinham como pagar, com que... Era só para tapear as despesas. Nem paga era. Nós trabalhamos por amor e porque tinha que ser feito... Assim, mesmo... também o Dr. Harry. Acho que ele tinha que ter muito amor à profissão de médico, por que foi... começou... foi lutando, assim... sem nada, tudo tão difícil... Mas, desde o começo se saiu bem! A paga que se tinha era o conforto espiritual, a amizade e o bem querer de todos”.
Perguntada mais, sobre o movimento do hospital, responde: “Estava sempre lotado. Tudo ocupado. Quartos com dois ou três doentes. Depois foi feito no porão, mais seis quartos e estavam cheios. Nós já morávamos no porão. Não tinha mais lugar”. Meu Deus! Era uma trabalheira. A mãe ainda trabalhava na roça. Depois teve que deixar, mas não deixou nunca suas “vaquinhas de leite”, que ela adorava. Eram raça Jersey e Holandesa. Tinha a “Boneca”, a “Preta”, a “Diana”. Ela também costurava, fazia todo tipo de roupas. De vestir, de cama, mesa e banho. Vestido de noiva, plissado. Era costureira fina. Trabalhava até altas horas com lampião “chareto”. Era costura, remendo, tudo. As roupas do hospital, tudo tinha que ser limpo, desinfetado. Roupa fervida na água, tempo... Passar com ferro em brasa. Água de poço sempre fervida, o vasilhame limpo, areado, louças, bacias, tudo. Olha, o Dr. Harry, se ele via a gente trabalhando, a Mãe, no sufoco do serviço, rachando lenha, pois ele vinha lá. O Dr. Harry não media esforço. Ele pegava junto no serviço pesado. Quando o hospital teve que sair da casa da Mãe, o Dr ficou mais de mês levando as coisas devagarzinho e bastante sentido. Ele não queria, não conseguia sair de lá. E depois que saiu, ele visitava a nossa Mãe todo dia. De manhã, tarde, noite... Qualquer hora, não deixava de visitar a Dona Henriqueta ”. E, continua.-“ As dificuldades de atendimento médico eram muito grandes e os riscos do atendimento também. Muitas vezes faltava o essencial para as operações, que era o “antibiótico”, que naquela época se reduzia a “penicilina”, e que tinha de vir de Concórdia, mantida no farelo com gelo para conservar. Por isso, nada era garantido. As operações, as cesarianas, por exemplo, eram de alto risco. Fazia-se o possível e o impossível. Muita gente morreu por falta de penicilina. A gente de hoje não entende o grau de dificuldade existente naquela época, com febre tifóide, crupe, varíola, enfim, todas estas doenças que hoje as vacinas eliminaram, e todas as condições e doenças que hoje os antibióticos variados curam. Aquele tempo, sem nada, os cuidados tinham que ser redobrados. Mesmo assim, hoje em dia, com toda evolução da ciência, quantos morrem por infecção hospitalar ”.
Perguntada Dona Elibretina sobre o atendimento anterior à vinda do Dr. Harry, responde:
“Naquela época, tinha o farmacêutico Raitz, que vinha do Itá. Depois o Kurt Quelmacz, e depois o Valentim Petry, que veio morar na nossa casa e ali instalaram farmácia quando ainda era solteiro. Ele depois ajudava o Dr. Harry nas operações. Depois de casado, Dona Lira Petry ajudava. Eu lembro o Valentim, junto com o Dr. Harry, esfregando as mãos mais de meia hora com um sabonete branco para desinfetar antes das operações e depois vinham as luvas, aventais e máscaras de roupas brancas limpíssimas”.
Sobre o nome do hospital, responde: “O nome que usavam para citar o hospital, era o “Hospital de Dona Henriqueta”, ou “Hospitalzinho”. Acho que as pessoas sabem... Ficou assim... Mas, o Dr. Harry sabe muito bem, porque ele veio aqui com a filha dele, quis tirar uma foto com a Nona Henriqueta, “Dona Henriqueta”, como ele chamava, a sua primeira enfermeira. O que ela não fez pelos doentes, naquela época, o que ela não fez!... As pessoas de hoje nem sabem e não tem condições de aquilatar”.
           Perguntada sobre algum fato que a marcou profundamente citou: “Aquela noite que aconteceu em que Dona Letícia Farina, que caiu um raio lá, Meu Deus! Sim, ela faleceu ali, sim. Toda queimada... Toda queimada... Ela gritava... Toda queimada. Inclusive, naquele dia, deu um vendaval e eu corri para pegar a roupas no varal, caí da escada, bati a cabeça e perdi os sentidos. Ninguém viu. Eu fiquei tempo desacordada. Quem me socorreu foi o Amélio. Então eu fiquei de cama, e ela que tinha ficado sabendo o que aconteceu pra mim por volta do meio-dia, perguntava. -"E a Libre como é que está?” – Este fato, evidente, nunca vou poder esquecer de Dona Letícia.”



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